terça-feira, 12 de abril de 2011

over-and-over

PARTE II


Ela pegou o celular, e o encarou, fazendo pensamento positivo, para qualquer coisa. Mas que pelo amor de Deus, ele mandasse um sinal de vida. Nada. Dez minutos depois, fez a mesma coisa. Sentia muita coisa quando pensava nele, porém naquele exato momento, só conseguia se sentir indignada.
- Eu estou cansada. CANSADA. - sussurrou baixinho para o celular, como se falasse com alguém.
 Abriu a caixa de mensagens. Nada. Decidiu mandar uma, a última.

                 Não volte mais, não me procure, não me ligue, simplesmente não. Essa foi a última vez.                                       

Apertou enviar com uma dor no coração. Mas, enviou. Ela estava cansada de tudo isso, todo esse drama sem fim. Esperava que tudo isso tivesse finalmente acabado. Já tinham se passado meses desde a última vez que o tinha visto, e sabia que enquanto não colocasse um fim em tudo, ia continuar acontecendo, como num ciclo vicioso, ele volta, ela esquece, ele some, ela sofre. E de novo, ele volta, ela esquece...
 Deitou na cama bagunçada, o material da escola espalhado, canetas, apostilas, cadernos. Era domingo, dia seguinte teria aula e ela precisava terminar algumas coisas, olhou no relógio que marcava 14:50 . Decidiu fazer antes que se esquecesse, pegou os cadernos, abriu as apostilas, olhou as aulas de segunda feira.                    
 Começou com exercícios de física, antes de terminar o segundo, estava sonolenta, os cadernos escorregaram de sua mão, e ela dormiu.

 Abriu os olhos vagarosamente, e no mesmo momento, viu a janela, estava escurecendo. Olhou para o relógio, 17:20. Tinha dormido algumas horas, porém, um sono tranquilo que não tinha a meses, seu quarto estava silencioso, mas no andar de baixo, duas pessoas conversavam, ela demorou alguns minutos até perceber, que eram sua mãe e seu pai, tinham voltado de viagem, finalmente. A calmaria foi interrompida por um chamado.
 - Scarllet, Scaaaarllet, vem aqui embaixo - sua mãe gritou.
 - Sim mãe, já desço.
 Assim que abriu a porta do quarto, sentiu um aroma muito conhecido por ela. Bolo de chocolate. Ela sabia que isso não poderia terminar em coisa boa. 
 Desceu as escadas, cumprimentou a mãe que estava fazendo algum tipo de calda no fogão, e o pai que lia jornal sentado em uma cadeira ao lado. Tentou ficar fora da trajetória em que o cheiro de doce se fazia mais forte. Mas a vontade de comer já era tamanha.
- Então, vocês chegaram faz tempo? Como foi a viagem? - Perguntou Scarllet, meio desinteressada.
- Ah, foi ótima, não não, faz umas duas horas eu acho, nem as malas a gente desfez, olha só! - deu uma risada estranha, e continuou a contar sobre os inúmeros detalhes da viagem. 
Scarllet nesse momento já não prestava a mínima atenção, pensava em tudo, principalmente em resistir a tentação que era comer um pedaço daquele bolo, mentalmente repetia *eu não preciso de comer, eu não devo comer, eu não vou comer, eu não posso comer, eu não quero comer*, a viagem não era novidade, estava mais do que acostumada, eram pelo menos duas por mês, com uma semana cada uma, ás vezes mais, e já nem ligava em ficar sozinha a maior parte do tempo. Uma vez por ano, quando seu pai visitava a sede da empresa na Rússia, ela ficava em casa, e eles ficavam por lá quase um mês.
 O trabalho de seu pai exigia isso, e sua mãe havia largado o emprego para poder acompanha-lo, e mesmo assim, gostava de ficar sozinha em casa... uma música conhecida podia ser ouvida de longe...
- Scarllet, seu celular tá tocando filha - a mãe dela mal tinha terminado de falar e Scarllet já estava subindo a escada em direção ao seu quarto. Correu, e a música ficava cada vez mais alta, chegou até o quarto, abriu a porta, e viu todos os livros e cadernos ainda jogados na cama, percorreu o edredon com os olhos, e achou o celular "recebendo chamada - número restrito". Ela suspirou, aquelas ligações vinham acontecendo muito, todo dia, tinha no mínimo uma, Scarllet não atendia a todas, porém sim, a maioria, mais pela curiosidade do porque daquilo do que por descobrir quem era. Atendeu.
- Alô? hm
Na outra linha, era só silêncio.
- Alôôô? sério, de novo isso? se você não responder, eu vou desligar.
Ainda silêncio, porém podia se ouvir uma respiração, alta, rápida. 
- Não! Espera. Não desliga Scarllet. Eu.. Eu... Eu preciso falar com você. - a voz era grave, conhecida, mas ela não parou para prestar atenção.
- O que? Então todas as outras quatrocentas vezes que você ligou, você desligou porque seu animal? - Ele ria na outra linha. Ela estava mesmo brava, e não entendia o motivo da risada. 
- Ah, queria eu que fosse tão fácil assim, eu pegava o telefone, ligava, mas era só ouvir sua voz que eu entrava em pânico. - Ele falou, e no final, saiu como se estivesse aliviado.
- Ah, claro, e você pode por favor me falar agora o motivo de me ligar? aliás, quem é você? 
- Estou decepcionado, você não reconheceu a minha voz? - Seu tom soava como se tivesse mesmo decepcionado.
- Até tenho um palpite, porém, é improvável, enfim.. Estou ficando impaciente. Dá pra resolver isso logo?
- É, é. Você não muda mesmo não é Anne. Impaciente. É que quando eu recebi aquela sua mensagem, eu simplesmente, fiquei louco, não posso te perder.
 A reação dela foi instantânea, desligou o celular tão rápido que nem viu. Correu para o banheiro, olhou-se no espelho, a pele já branca estava transparente. Abriu a torneira, jogou uma água no rosto, ficou ali parada um instante, e então voltou para o quarto. 
- Tudo bem, eu estou calma, eu estou calma - Ela estava surtando. - E ele ainda tem a coragem de me chamar de Anne? Ah, por favor. 
 O celular tocou novamente, e ela deu um pulo com o susto, não precisava nem olhar pra saber que era ele.
E agora, atendia ou deixava tocar? 



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